Nós últimos dias está circulado pela Interwebs uma polêmcia sobre a cobrança indevida das distribuidoras na contas de luz e a redução nas tarifas de energia elétrica. O tema está sendo julgado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e, no momento, parece caminhar para o ressarcimento dos consumidores.
Entretanto, em face ao tom alarmante e sensacionalista dos artigos que têm circulado por aí, é preciso analisar a situação com um pouco mais de cautela.
Colocando os Valores em Perspectiva
A maioria dos artigos que eu consegui encontrar mencionam valores astronômicos cobrados indevidamente dos consumidores mas bem poucos entram em maiores detalhes. Para auxiliar no desenvolvimento do texto, é preciso colocar esses valores em perspectiva.
Primeiro, podemos usar o Sistema de Apoio à Decisão (SAD) da Aneel para obter algumas informações relevantes como, por exemplo, a tarifa residencial média mensal para cada um dos anos de 2002 até 2009 e o número de consumidores em cada um deles. Calculando a média dos valores no período resulta no seguinte:
- Tarifa residencial média no período: R$ 277,46 (quanto, em média, cada consumidor pagou na conta de luz).
- Média de unidades consumidoras no período: 49.291.987,63 (número de consumidores das contas luz).
Levando em conta um período de 98 meses, compreendido entre janeiro de 2002 e fevereiro de 2010, podemos calcular o valor cobrado, diminuir a cobrança indevida e calcular o quanto, em média, foi o excedente para cada consumidor. Desta forma:
- Faturamento total aproximado no período: R$ 1.340.278.225.796,45, ou seja, um trilhão, trezentos e quarenta bilhões, duzentos e setenta e oito milhões, duzentos e vinte e cinco mil, setecentos e noventa e seis reais e quarenta e cinco centavos.
- Valor aproximado da cobrança indevida: R$ 7.000.000.000,00 (sete bilhões).
- Faturamento total aproximado no período sem a cobrança indevida: R$ 1.333.278.225.796,45 (um trilhão, trezentos e trinta e três bilhões, duzentos e setenta e oito milhões, duzentos e vinte e cinco mil, setecentos e noventa e seis reais e quarenta e cinco centavos).
Então, R$ 7 bilhões continua parecendo muita coisa? Não muito né, mas o dinheiro é “nosso”, então, vamos ver quanto a gente vai ganhar dessa bolada:
- Tarifa residencial média no período sem a cobrança indevida: R$ 276,01 (quanto, em média, cada consumidor deveria ter pago na conta de luz).
- Diferença entre o que foi pago e o que deveria ter sido pago: R$ 1,45.
- Total excedente no período: R$ 142,01.
Ou seja, em um período de 98 meses o valor excedente cobrado foi de proximadamente R$ 142,01. Não é, necessariamente, esse o valor a ser devolvido, sendo favorável a decisão do TCU. É possível que seja a mais (até 2 vezes o valor cobrado) ou a menos, caso as distribuidoras consigam negociar com o governo. É importante entender que isso ainda está sendo julgado e não há uma decisão final sobre o assunto.
A Redução de Tarifa é Falácia?
Agora que desmistificamos a cobrança indevida, nós podemos ir para a segunda parte do texto e analisar como a redução das tarifas se compara frente à redução da conta de energia elétrica anunciada pelo governo.
Segundo a planilha de Consumidores, Consumo, Receita e Tarifa Média – Por Classe de Consumo do SAD da Aneel, a média da tarifa residencial para 2011 foi de R$ 314,07. Usando a matemática do primeiro grau ensino médio, mais as estimativas do governo, chegamos a uma redução de aproximadamente R$ 50,88 POR MÊS na média da tarifa de consumo residencial. Mais uma vez: CINQUENTA REAIS POR MÊS, para quem está dentro da faixa de consumo médio nacional. Esse valor é consideravelmente maior do que valor referente a cobrança indevida.
Conclusão
Houve, sim, uma cobrança indevida e esse valor deve voltar para o bolso dos consumidores. Entretanto, dizer que o governo somente está devolvendo aquilo que já era seu é uma simplificação grosseira e sensacionalista. Comparar a redução tarifária com a cobrança indevida não fornece uma visão adequada da situação.
Como sempre, para evitar confusões, o melhor é tentar analisar a situação no melhor contexto possível.
Observações finais
1. Como os dados de 2002 não estão disponíveis no SAD da Aneel, achei por bem jogar os valores para cima e usar os mesmos números de 2003.
2. O SAD não dá muitos detalhes sobre a origem dos dados, mas foi a melhor fonte que eu consegui obter para calcular esses valores.
3. Uma planilha com as contas e os dados que eu utilizei encontra-se aqui.
4. Não sou governista. Nem de direta. Muito menos de esquerda.